0 CONHECENDO UM POUCO MAIS DO UNIVERSO DE ZUZU ANGEL








ZUZU ANGEL
1921-1976

Dando continuidade às mulheres da política, vamos falar de uma mineira muito especial, Zuleika Angel Jones, que, apesar de ser um sucesso no exterior e de ter vestido estrelas como Liza Minelli, Joan Crawford e Kim Novak, foi morta em um acidente de carro forjado por agentes dos órgãos de repressão política. Por que foi assassinada? Por ter enfrentado a ditadura militar, na busca incansável pelo responsáveis pela morte de seu filho, o jornalista Stuart Angel.

Nascida em Curvelo, MG, em 5 de junho de 1921, Zuzu mudou-se ainda criança para Belo Horizonte, onde fez o curso primário no Grupo Escolar Barão do Rio Branco e o ginasial no Colégio Sagrado Coração de Jesus. Em Minas Gerais fazia roupas para primas, quando começou a trabalhar profissionalmente como costureira nos meados dos anos 50.

Em 1947, foi para o Rio de Janeiro onde morou até o fim de sua vida. Nos anos 70, abriu sua loja em Ipanema e fez desfiles com bastante sucesso no exterior, para onde levou a linguagem brasileira. Desde que começou a carreira, Zuzu mostrou que sua arte seria fruto de seu espírito corajoso, envolvente e alegre. Ela viveu plenamente o espírito dos anos 60, transformando panos de colchão, fitas de gorgurão, rendas do norte, pedras preciosas, estampados de pássaros e papagaios, babados e zuartes em saias, chales e vestidos maravilhosos, em uma moda bem brasileira, que encantou o mundo. Não é à toa que um anjo era a logomarca de sua confecção, pois tudo o que ela fazia estava inspirado na liberdade, e fundamentalmente, em sua maneira única de ver a cultura brasileira.

Quando se tornou uma estilista reconhecida internacionalmente, seu filho Stuart Angel Jones, militante político, foi preso em 14 de maio de 1971 pelos agentes do CISA. Tido como desaparecido, na verdade foi torturado e assassinado. Segundo o depoimento de Alex Polari, encaminhado a Zuzu, Stuart foi arrastado por um jipe pelo pátio interno da Base Aérea do Galeão, com a boca no cano de descarga do veículo. Ele também ouviu os gritos de Stuart – numa cela ao lado – pedindo água, dizendo que ia morrer e, pouco depois, seu corpo foi retirado da cela. Este depoimento de Alex consta do vídeo "Sônia Morta e Viva", sobre a nora de Zuzu, a também militante política Sônia Angel, produzido e dirigido por Sérgio Weisman, em 1985.

Quando soube de toda tragédia, Zuzu Angel passou a denunciar de maneira incansável as torturas realizadas pelo governo militar e tornar público em todos os lugares onde ia detalhes da morte e ocultação do cadáver de Stuart, inclusive para a imprensa estrangeira. Zuzu chegou a entregar uma carta a Henry Kissinger, na época Secretário de Estado do Governo norte-americano, pedindo apoio, visto que seu filho também tinha a cidadania americana. Durante cinco anos, buscou reaver o corpo de Stuart, cuja morte e prisão jamais foram admitidos pelos órgãos de segurança.

O abalo inicial transformou-se em energia para a criação da "primeira coleção de moda política da história". Zuzu usou estampas com silhuetas bélicas, pássaros engaiolados e balas de canhão disparadas contra anjos. O anjo tornou-se o símbolo de Tuti, o filho desaparecido, caracterizando suas coleções de moda: anjos amordaçados, meninos aprisionados, sol atrás das grades, jipes e quepes. Dessa maneira, a sua criatividade audaz e até mesmo o bom humor foram as armas que ela usou contra a ditadura. Costumava dizer: "No meu país acham que moda é frivolidade, futilidade. Tento lhes dizer que moda é comunicação, além de dar emprego para muita gente", completando que tudo o que fazia era inspirado pela vontade de justiça. "Eu não tenho coragem, coragem tinha meu filho. Eu tenho legitimidade", dizia.

Zuzu morreu em um acidente de automóvel muito estranho. Testemunhas afirmam que havia um jipe do Exército, logo após o acidente, na saída do túnel Dois Irmãos. Ela própria anunciou as ameaças que vinha recebendo: "Se eu aparecer morta, por acidente ou outro meio, terá sido obra dos assassinos do meu amado filho".

Uma semana antes do acidente que a vitimou fatalmente, Zuzu deixara na casa de Chico Buarque um documento que deveria ser publicado caso algo lhe acontecesse. A morte veio logo em seguida. Chico fez, então, uma homenagem a ela, que transcrevemos aqui, a canção "Angélica".

Quem é essa mulher

Que canta sempre esse estribilho

Só queria embalar meu filho

Que mora na escuridão do mar

Quem é essa mulher

Que canta sempre esse lamento

Só queria lembrar o tormento

Que fez o meu filho suspirar

Quem é essa mulher

Que canta sempre o mesmo arranjo

Só queria agasalhar meu anjo

E deixar seu corpo descansar

Quem é essa mulher

Que canta como dobra um sino

Queria cantar por meu menino

Que ele já não pode mais cantar

Zuzu Angel foi sepultada pela família, em 15 de abril de 1976, no Cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro. Ousada, criativa, inovadora, anti-militarista e talentosa, são essas heranças que a estilista Zuzu Angel deixou para nós.

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